Para chegarmos à neutralidade climática é preciso que, além das reduções constantes nas emissões, haja sequestro do carbono. E a tecnologia disponível para isso é a produção e a manutenção de florestas.
Dentre os diversos desafios que temos enquanto sociedade, a questão das mudanças climáticas relacionadas com as emissões de gases de efeito estufa está entre as que saíram do patamar de alerta de poucas páginas do relatório da ONU “Nosso futuro comum”, da década de 1980, para um fato gerador de problemas reais na economia de hoje, com vários riscos se materializando e sendo acompanhados pelos países do G20 e grandes empresas.
Por isso, o conjunto de países reunidos na ONU detalhou em seus Objetivos de Desenvolvimento Sustentável que era necessário “tomar medidas urgentes para combater a mudança do clima e seus impactos”. O Acordo de Paris na Conferência entre as Partes (ou seja, entre os países) acordou que o aumento da temperatura deveria ficar limitado a 2°C, buscando-se esforços para limitá-lo a 1,5°C. Era um momento de esperança de uma ação coordenada, em uma rota de desaceleração da dependência dos combustíveis fósseis.
Hoje, o desafio é muito maior. Não só pelos problemas gerados por dois anos de pandemia da Covid-19, mas porque as questões sociais e econômicas de curto prazo diminuíram o impulso de alguns países em suas ambições para a questão, além da evidente degradação do ambiente de cooperação multilateral entre países. Como efeito, temos posicionamentos unilaterais ou de blocos sem a força necessária para a descarbonização – o que, em última análise, impacta a existência dos seres viventes desse planeta, levando a maior risco de fome, suscetibilidade a catástrofes ambientais e a doenças.
Do ponto de vista dos processos produtivos e da pesquisa e desenvolvimento, continuam os esforços de várias organizações para prover bens e serviços com baixa emissão de carbono. Empresas ligadas ao Pacto Global da ONU, entre outras engajadas nesse esforço, demonstram essa viabilidade.
Porém, para chegarmos à neutralidade climática (ou seja, não acrescentarmos mais carbono na atmosfera) é preciso que, além das reduções constantes nas emissões e dos esforços de empresas e governos nesse sentido, haja sequestro do carbono! E a tecnologia disponível que temos para tal, é a produção e a manutenção de florestas.
A grosso modo, metade da massa de uma árvore é carbono, capturado durante seu ciclo de crescimento, que, em grande parte das espécies, gira em torno de 20 anos.
Além disso, árvores podem ser plantadas e integradas com outras operações existentes. Partindo desde o básico, como um plantio mais adensado em margens de rios — que colabora para a manutenção da sua água –, ou, no caso do Brasil, em área da Reserva Legal obrigatória. O plantio pode ainda ser aliado com produtos não madeireiros (como frutos), ou ainda em um manejo planejado e autorizado, aumentando a quantidade de árvores no território (processo totalmente legal). E pode chegar inclusive ao mundo agro, com a integração lavoura, pecuária e floresta, que, quando bem executada, aumenta a produtividade tanto das safras como do gado – além de aumentar o bem-estar animal, pela sombra gerada pelas árvores –, criando uma renda com o manejo de diversos tipos de madeiras, frutos ou resinas. Além disso, a construção de corredores ecológicos no entorno de plantações pode contribuir com a saúde das lavouras e proteger o solo de erosões.
Ao integrar a estratégia do plantio de árvores ao negócio, não estamos dando uma solução somente ao problema do carbono. Se bem planejada, a questão da perda da biodiversidade também será trabalhada. Quando pensamos no conceito moderno de Saúde Única, da interação cidade-campo e seres humanos-outras formas de vida, aprendemos que essa interdependência também é chave para a qualidade de vida de hoje e de nossos descendentes. E os créditos de carbono possíveis de serem gerados nessas florestas podem contribuir na viabilidade dessas implantações. Glasgow tem papel vital nesse sentido, criando os instrumentos para regulamentar essas operações.
*Por: David Canassa – Diretor da Reservas Votorantim, empresa da Votorantim S.A, especializada em gestão de territórios e soluções baseadas na natureza para negócios tradicionais e da nova economia.